INSPIRAÇÃO
Tudo começou com Jesus chegando na beira do mar da Galileia e chamando esses irmãos e pescadores: Simão, André, Tiago e João. Eles deixaram tudo e seguiram Jesus. Dois mil anos se passaram e homens e mulheres continuam repetindo o mesmo chamado de Jesus a outros homens e mulheres. Toda a vida da Igreja é feita disso. Só que Jesus disse: “Deixem tudo e me sigam”. A partir dali, Tiago, João, André e Simão disseram: “deixem tudo e sigam Jesus”; assim, essa onda foi se transformando das mais variadas formas, com os mais variados carismas, segundo a vontade de Deus e a criatividade sem fim do Espírito Santo.
Quando cheguei em Salvador, com 16/17 anos, fui morar na casa da família Dona Mercês e Seu Antônio e o primo dele Paulo, que tinha feito Escalada, disse: “Manoel, você quer fazer esse encontro?”– aqui entre nós, ele já tinha me falado tudo e já tinha me contado tudo. Porque eu morava no interior e ele nunca imaginou que eu viesse morar em Salvador. “Quer fazer o encontro?”, essa pergunta de Paulo é o mesmo chamado de Jesus para André e Tiago. Cada um aqui teve o seu: aquele que te entregou a ficha, aquele que te convidou, aquele que te empurrou (porque tem a turma também que foi empurrada, igual calouro de Silvio Santos). Cada um teve o seu.
A pessoa que nos chama é Jesus na beira do barco, na beira do mar da Galileia, na beira da história pessoal de cada um, pinçando para uma experiência com Ele, dentre tantas possibilidades neste simples e humilde “Ser pessoa em clima de oração”. Teve gente que foi pinçado para ser cursilhista, teve gente que foi pinçado para ser franciscano, teve gente que foi pinçado por Jesus para ser redentorista, teve gente que foi pinçado para ser folcolarino... a gente foi pinçado para ser alpinista. Mas foi Jesus, na beira do barco, na beira do mar da nossa história, ao lado do barco da nossa história, foi Jesus que nos chamou, isso há 40 anos.
Herdamos esta história, herdamos este legado. Trazemos conosco algo que não pode ser contado, é um equívoco. Eu acho uma miopia querer medir o que Jesus fez em nós, através de nós e apesar de nós nestes 40 anos, se a gente quiser medir isso em números. Não. Foi muito mais do que x encontros, foi muito mais do que y alpinistas, é muito mais do que 12 cidades, é muito mais do que tantos zonais. É muito mais. É uma riqueza que a gente não consegue contar. É um dom que a gente não consegue medir e toda tentativa de colocar dentro de uma caixinha das nossas medidas vai ser absolutamente relativa e limitada diante da graça.
Quem pode contar os abraços, nesses 40 anos? Quem pode contar os olhares amorosos, desses 40 anos? Quem vai cair na besteira de contar os papos que você não teria com ninguém, mas tem com um amigo do Escalada? Quem vai contar isso? Quem vai contar as confidências mais profundas de sua alma? Quem vai contar as lágrimas derramadas? Quem vai contar os sorrisos dados? Quem vai contar as partilhas de vida? Quem vai contar? É uma bobagem tentar contar, porque a gente não dá conta de colocar no limite do tempo e do espaço. De colocar, no limite das nossas medidas humanas, o amor sem medida de Deus, circulando em nós, entre nós e a partir de nós. Não dá para contar nesse tempo todo. E a gente pode até dizer: foi muito mais do que 40 anos. É muito mais, porque cada segundo vivido no amor tem sabor de eternidade e eternidade não se conta. Cada segundo vivido na fé, toca o céu e o céu a gente não consegue contar. A gente está contando 40 anos, mas Deus não conta nada: só ama. Então, vamos viver estes 40 anos, vamos viver esta celebração. Não é festa, é celebração. Vamos viver esta celebração com gostinho de eternidade. Não vamos querer limitar nos nossos esquemas o que Deus tira de todos os esquemas. Não vamos querer limitar nas nossas medidas uma “sem medidas” de possibilidades que Deus age, cada vez mais, na vida da gente.
“Cada segundo vivido na fé, toca o céu e o céu a gente não consegue contar. A gente está contando 40 anos, mas Deus não conta nada: só ama”.
Sim, somos muito mais que um milhão. Somos muito mais que 40 anos. Somos muito mais que todas as coisas possíveis que porventura tenhamos feito. Somos muito mais. Porque somos resultado do amor de Deus circulando na vida da gente. Graças a um homem, um barco e alguns pescadores. Graças a isso, somos muito mais. Porque o nosso lugar, a nossa medida, é o céu. A nossa medida é a eternidade. O nosso horizonte está bem longe, bem grande, bem alto. A nossa montanha é uma montanha que as medidas humanas não medem; só o coração de Deus é capaz de abarcar. Então, sigamos, sem prender o Espírito Santo, sem aprisionar a Graça e celebrando, portanto, atualizando a Graça de Deus no “Ser pessoa em clima de oração”.
Homilia de Padre Manoel Filho, assistente eclesiástico do Movimento Escalada na celebração comemorativa dos 40 anos do Movimento em Salvador